Opera Barroca

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quinta-feira, 19 de março de 2009

A educação de Carlos da Maia e de Eusebiozinho em confronto

A educação de Carlos da Maia e Eusébiozinho contrasta em muitos aspectos. Basta, por exemplo, ver a fonte da sua educação. No caso de Carlos da Maia, educado por um pedagogo inglês, Brown, contrasta imediatamente com o tipo de educação de Eusébiozinho que fora educado de uma forma tradicional e portuguesa. Carlos da Maia, contactava com a natureza; " Deixava-o cair, correr, trepar às árvores, molhar-se, apanhar soleiras (...)" enquanto Eusébiozinho permanecia em casa: "Mas o menino molengão e tristonho, não se deslocava das saias da titi (...)". Carlos aprendia línguas vivas como o inglês e brincadeiras divertidas: " Mostrou-lhe o neto que palrava inglês com o Brown (...) O pequeno muito alto no ar, com as pernas retesadas contra a barra do trapézio, as mãos às cordas, descia sobre o terraço. Por seu lado, "Eusébiozinho, por sua vez aprendia as línguas mortas como o latim e em vez de brincadeiras tinha contacto com livros velhos: " O latim era um luxo erudito. Nada mais absurdo que começar a ensinar a uma criança uma língua morta". Carlos tinha uma educação de carácter rigoroso, metódico e ordeiro:"tinha sido educado como uma vara de ferro (...) Não tinha a criança cinco anos e já dormia num quarto só, sem lamparina, e todas as manhãs, zás para dentro de uma tina de àgua fria, às vezes a gear lá fora(...) ". Já Eusébiozinho levava uma educação de super protecção: "nunca o lavavam para não o constipar". Carlos submetia a vontade ao dever, querendo ultrapassar a hora de deitar pois Vilaça estava lá em casa, e Eusébiozinho subornava a vontade pela chantagem afectiva quando disse à "mamã" que ela o deixaria dormir consigo essa noite se dissesse os versos. Carlos praticava exercicio - ginástica ao ar livre. Por seu lado, o outro rapaz não tinha qualquer actividade fisíca devido à sua saúde frágil. Carlos, porém, desprezava a cartilha e o conhecimento teórico enquanto Eusébiozinho a estudava.

O Jantar do Hotel Central; episódio da vida romântica

Neste jantar, as principais figuras proporcionam a Carlos um primeiro contacto com o meio social lisboeta. Este jantar pretende homenagear o banqueiro J. Cohen. Apresenta-se a visão crítica de alguns problemas sociais, bem como proporciona a Carlos a visão de Maria Eduarda.
Também a literatura e crítica literária são discutidas. Tomás de Alencar, poeta ultra-romântico, opõe-se ao realismo e ao naturalismo
, revelando incoerência quando condena no presente, o que cantara no passado. Sem mais argumentação, refugia-se na moral, considerando o realismo/naturalismo imoral. É um desfasado do seu tempo, defende a crítica literária de natureza académica. Este opõe-se a João da Ega, defensor da escola realista/naturalista.
Ega exagera e defende o cientificismo na literatura. Não distingue ciência e literatura.
Nesta discussão entram também, Carlos e Craft, recusando simultaneamente o ultra-romantismo
de Alencar e o exagero de Ega. Craft defende a arte como idealização do que de melhor há na natureza, defendendo a arte pela arte. O narrador concorda com ambos.
As finanças são também um tema debatido neste jantar. O país tem necessidade dos empréstimos ao estrangeiro. Cohen demonstra o seu calculismo cínico quando, ao ter responsabilidades pelo seu cargo, afirma que o país vai direitinho para a banca rota.
Outro tema também focado é a história e a política, cujos intervenientes são Ega e Alencar. O primeiro, aplaude as afirmações de Cohen, defende uma catástrofe nacional como forma de acordar o país. Afirma que a raça portuguesa é a mais covarde e miserável da Europa. Aplaude a instalação da república e a invasão espanhola. Alencar, por sua vez, teme a invasão espanhola e defende o romantismo político, esquecendo o adormecimento geral do país.
Cohen afirma que Ega é um exagerado e que nas camadas políticas ainda há gente séria. Dâmaso diz que se acontecesse a invasão espanhola fugiria para Paris.
Deste jantar sobressai a falta de personalidade de Ega e Alencar, que mudam de opinião quando Cohen quer, note-se que Ega está comprometido por ser amante da sua esposa, e Dâmaso foge de tudo. Sobressai, também, a falta de cultura e civismo que domina as classes mais destacadas, Ega e Alencar quase chegam a vias de facto.


Personagens intervenientes:
- João da Ega, promotor da homenagem e representante do Realismo/ Naturalismo;
- Cohen, o homenageado, representante das altas Finanças;
- Tomás de Alencar, o poeta ultra-romântico;
- Dâmaso Salcete, o novo-rico, representante dos vícios do novo-riquismo burguês, a catedral dos vícios;
- Craft, o britânico, representante da cultura artística e britânica, o árbito das elegâncias.


Temas discutidos:
- A literatura e a crítica literária
Tomás de Alencar
- opositor do Realismo – Naturalismo;
- incoerente: condena no presente o que cantara no passado: o estudo dos vícios da sociedade;
- falso moralista: refugia-se na moral, por não ter outra arma de defesa; - - acha o Realismo/ Naturalismo imoral;
- desfasado do seu tempo;
- defensor da crítica literária da natureza académica:
- preocupado com aspectos formais em detrimento da dimensão temática;
- preocupado com o plágio.


João da Ega
- defensor do Realismo/ Naturalismo;
- exagera, defendendo o cientivismo na literatura;
- não distingue Ciência e Literatura.


Carlos e Craft
- recusam o ultra-romantismo de Alencar;
- recusam o exagero de Ega;
- Carlos acha intolerável os ares científicos do realismo;
- Carlos defende que os caracteres se manifestam pela acção;
- Craft defende a arte como idealização do que melhor há na natureza;
- róximos da doutrina estética de Eça quando defende para a literatura uma nova formaCraft defende a arte pela arte.


O Narrador
- recusa o ultra-romantismo de Alencar;
- recusa a distorção do naturalismo contido nas afirmações de Ega;
- afirma uma estética próxima da de Craft: «estilos, tão preciosos e tão dúcteis»: tendência parnadiana.


- As finanças
- O país tem absoluta necessidade dos empréstimos estrangeiro;
- Cohen é calculista cínico: tendo responsabilidades pelo cargo que desempenha, lava as mãos e afirma alegramente que o país vai direitinho para a bancarrota.


João da Ega
- aplaude as afirmações do Cohen;
- delira com a bancarrota como determinante da agitação revolucionária;
- defende a invasão espanhola;
- defende o afastamento violento da Monarquia;
- aplaude a instalação da República;
- a raça portuguesa é a mais covarde e miserável da Europa: «Lisboa é Portugal! Fora de Lisboa não há nada.»


Tomás de Alencar
- teme a invasão espanhola: é um perigo para a independência nacional;
- defende o romantismo político:
- uma república governada por génios;
- a fraternização dos povos;
- esquece o adormecimento geral do país.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Confronto da educação de Carlos e de Eusébio

Carlos da Maia – Educação à Inglesa
Pedagogo Inglês – Brown
Contacto com a Natureza
“... Correr, cair, trepar às árvores, molhar-se, apanhar soalheiras, como um filho de caseiro...” (pág.57)
Aprendizagem de línguas vivas: Inglês
“... Mostrou-lhe o neto que palrava inglês com o Brown...”
Brincadeiras e divertimento
“Estou cansado, governei quatro cavalos...” (pág.73)
Rigor, método, ordem e disciplina
“...tinha sido educado com uma vara de ferro!...”, “...não tinha a criança cinco anos já dormia num quarto só, sem lamparina...” (pág.57)
Valorização da criatividade e juízo crítico
Submissão da vontade ao dever
“...Ainda é muito cedo, Brown, hoje é festa, não me vou deitar!... Carlos tenha a bondade de marchar já para a cama!” (pág.73)
Desprezo da Cartilha e do conhecimento teórico
“... É saber factos, noções, coisas úteis, coisas práticas...” (pág.63)
“...e pedira-lhe que lhe dissesse o Acto de Contrição. ... Que nunca em tal ouvira falar...” (pág.67)
Exercício físico: ginástica ao ar livre
“...a remar, Sr. Vilaça, como um barqueiro! Sem contar o trapézio, e as habilidades de palhaço...” (pág.58)

Conhecimento prático
Aprendizagens de línguas vivas: Inglês
Formatura em Medicina
Abertura, convivência e tolerância


Eusebiozinho – Educação Tradicional
Pedagogo Português – Abade Custódio
Proteccionismo
“... Passava os dias nas saias da titi...” (pág.78)
Aprendizagem de línguas mortas: Latim
“...a instrução para uma criança não é recitar Tityre, tu patulae recubans...”
Contacto com velhos livros, aprendizagem livresca sem experiência
“... Admirar as pinturas de um enorme e rico volume, «Os costumes de todos os povos do Universo»...” (pág.69)
Super protecção
“...levava ao colo o Eusebiozinho, que parecia um fardo escuro, abafado em mantas, com um xale amarrado na cabeça...” (pág.76), “...nunca o lavavam para o não constiparem...” (pág.78)
Valorização da memorização
“...Que memória! Que memória... É um prodígio!...” (pág.76)
Suborno da vontade pela chantagem afectiva
“...e a mamã prometeu-lhe que, se dissesse os versinhos, dormia essa noite com ela...” (pág. 76)
Estudo da Cartilha
“...a decorar versos, páginas inteiras do «Catecismo de Perseverança»...” (pág.78)
Débil na sua saúde e não tinha actividade física
“...Não tem saúde para essas cavaladas...” (pág.73)

Conhecimento teórico
Aprendizagem de línguas mortas: Latim
Bacharlato em Direito
Isolamento e intolerância

quarta-feira, 4 de março de 2009

Os Maias - Acção

Em Os Maias podemos distinguir dois níveis de acção. Por um lado, temos a crónica de costumes, acção aberta, em que através de episódios da vida romântica apresentam-se retratos da vida social lisboeta do séc. XIX. Por outro lado, temos uma acção fechada, que aborda a história da família Maias, através de quatro gerações; Caetano, Afonso, Pedro e Carlos.
Na acção que narra a família Maia, existe uma intriga secundária que narra a vida de Afonso da Maia, época de reacção do Liberalismo ao Absolutismo; a história de Pedro da Maia e Maria Monforte, época de instauração do Liberalismo e consequentes contradições internas; a história da infância e juventude de Carlos da Maia, época de decadência das experiências liberais. Na intriga principal são retratados os amores incestuosos de Carlos e Maria Eduarda que terminam com a desagregação da família com a morte de Afonso e a separação de Carlos e Maria Eduarda.
Carlos é o protagonista da intriga principal. Teve uma educação à inglesa e tirou o curso de medicina em Coimbra. A educação de Maria Eduarda foi completamente diferente, donde se conclui que a sua paixão não foi condicionada pela educação, nem pela hereditariedade, nem pelo meio. A sua ligação amorosa foi comandada à distância por uma entidade que se denomina destino.
A acção principal d' Os Maias, desenvolve-se segundo os moldes da tragédia clássica; peripécia, reconhecimento e catástrofe.
A peripécia verificou-se com as revelações casuais de Guimarães a Ega sobre a identidade de Maria Eduarda; o reconhecimento, acarretado pelas revelações de Guimarães, torna a relação entre Carlos e Maria Eduarda uma relação incestuosa, provocando a catástrofe consumada pela morte do avô e a separação definitiva dos dois amantes.

Pedro da Maia

A educação tradicional e profundamente proteccionista a que Pedro foi sujeito desenvolveu-lhe uma personalidade «fraca». Com esta personagem, o autor terá pretendido desenvolver a ideia de que cada indivíduo não pôde fugir à sua origem hereditária -Pedro saía à mãe Maria Eduarda Runa- ao meio em que cresceu e à educação clerical e tradicional .

Assim prefigura uma personagem ultra-romântica que sucumbe perante as adversidades da vida, regendo-se pelos seus sentimentos arrebatadores.


-Vida dissoluta
- Encontro fortuito com Maria Monforte e paixão arrebatadora por ela
- Pedro procura um encontro com Maria, conseguindo-o através de Alencar
- Desobedece ao pai seguindo os seus sentimentos
- Encontros e Casamento
- Vida de casados: viagem ao estrangeiro, vida social em Arroios, nascimentos dos filhos
- Retardamento do encontro com Afonso
- Elemento desencadeador da tragédia: Tancredo, o Napolitano
- Infidelidade e fuga de Maria e reacções atónicas de Pedro
- Desenrola-se a tragédia
- Regresso de Pedro ao Ramalhete, diálogo com Afonso e suicídio de Pedro

Podemos, assim, dizer que Pedro da Maia recebeu uma educação à portuguesa com imposição de uma devoção religiosa punitiva, fuga ao contacto directo com a natureza e o mundo prático. Quando Maria Monforte aparece em Lisboa, atrai-o como um íman; o casamento fez-se contra a vontade do pai de Pedro. Quando esta foge com Tancredo, Pedro acaba com a sua vida. O destino desta personagem foi totalmente condicionado pelos factores naturalistas: a hereditariedade - mãe, e educação, ao contrário dos seus filhos, que não são influenciados por estes factores naturalistas.